Portaria MF nº, de 20 de fevereiro de 1943

Um dos assuntos numismáticos que tem tomado nossa atenção é a questão da demonetização das moedas do primeiro real, visto que real e cruzeiro circularam juntos por algum tempo. Nessa toada, encontramos a portaria que abaixo se segue e que, por enquanto, a única fonte é o relatório do ministro da Fazenda Arthur de Souza Costa ao presidente Getúlio Vargas. Nela se trata do início do recolhimento das peças de 300 réis — ou 30 centavos de cruzeiro — em quatro unidades federadas, as mais populosas, bem no início de vigência da nova moeda, que passou a ser oficial em 1º de novembro de 1942.

Arthur de Souza Costa, gaúcho, foi ministro dos Negócios da Fazenda entre 1934 e 1945.


PORTARIA Nº 17 — de 20 de fevereiro

Dispõe sobre a substituição de moedas do antigo cunho pelas repartições de Fazenda no Distrito Federal e nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais.

O Ministro do Estado dos Negócios da Fazenda, usando da atribuição que lhe confere o art. 8º do Decreto-lei nº 4.791, de 5 de outubro de 1942, e tendo em vista a conveniência de iniciar-se a substituição gradativa das moedas metálicas do antigo cunho pelas de que trata o art. 3º do referido decreto-lei, recomenda às repartições de Fazenda no Distrito Federal e nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas que providenciem no sentido de serem substituídas as moedas do antigo cunho de 300 réis (30 centavos), observadas as seguintes instruções: 

1º) As repartições de Fazenda no Distrito Federal não utilizarão em seus pagamentos nem incluirão nos saldos que houverem de recolher no Banco do Brasil, na forma da legislação em vigor, as moedas de 300 réis (30 centavos) do antigo cunho, levando-as à Casa da Moeda, para imediata substituição pelas novas moedas de dez e vinte centavos, na base de duas destas por uma daquelas;

2º) Nos Estados do Rio do Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, a substituição far-se-á por intermédio das respectivas Delegacias Fiscais, às quais devem as repartições subordinadas recolher, semanal, quinzenal ou mensalmente, todas as moedas de 300 réis (30 centavos) que houverem recebido; 

3º) As Delegacias Fiscais indicadas no item anterior remeterão diretamente à Casa da Moeda, em recipientes especiais por esta fornecidos, as moedas a substituir, compreendendo as provenientes das repartições subordinadas e as que houverem recebido em seus próprios “guichets”, sendo tais remessas realizadas, com as devidas cautelas, à proporção que se completar a capacidade de cada recipiente; 

4º) De posse das novas moedas de dez centavos (Cr$ 0,10) e vinte centavos (Cr$ 0,20), providenciarão as Delegacias Fiscais sobre o respectivo lançamento na circulação, utilizando-as em seus pagamentos (observado o disposto no art. 5º do Decreto-lei nº 4.791, de 5-10-942), suprindo as repartições que tenham remetido as moedas antigas ou incluindo-as nos saldos que houverem de recolher no Banco do Brasil; 

5.°) A Controladoria-Geral da República e a Casa da Moeda baixarão as normas a serem observadas para a contabilização e para o serviço de recolhimento e remessa das moedas trocadas. 

A. de Souza Costa

Fonte:

Relatório apresentado ao Exmo. Sr. presidente da República, Dr. Getulio Dornelles Vargas, pelo ministro dos negócios da Fazenda, Arthur de Souza Costa – Exercício de 1943, p. 244-245, disponível em: <https://archive.org/details/rmfazenda1943/page/n265/mode/2up>. Acesso em: 07 jun. 2023.

O Brasão da República na numária nacional

A moeda e os símbolos do poder têm uma longa história em comum, visto que, tradicionalmente, a emissão de moeda era privilégio real e, por conseguinte, estatal. Por isso, quando não tínhamos o retrato de Sua Majestade nas moedas, tínhamos o brasão de armas do reino; exemplos é o que mais há na numária mundial, principalmente naquela anterior ao século XX.

E, quando a moeda traz a representação de um brasão, temos a interseção da numismática com uma arte ou ciência muito tradicional, a heráldica, que regula ou dita regras de desenho e concepção para os brasões. A heráldica ocidental tem origem na Idade Média, nos torneios de justa e nas batalhas, quando se usava o desenho do escudo do cavaleiro para simbolizá-lo. Com o tempo, não apenas os cavaleiros tinham seus escudos — agora já mais uma ideia do que a representação de um objeto real — mas também a nobreza e a realeza. O escudo do rei confundiu-se com o do reino e, eventualmente, passou a ser um símbolo nacional.

E aqui cabe uma precisão: o que geralmente consideramos emblema nacional é o chamado brasão de armas, formado pelo escudo — o elemento central — e vários outros elementos adicionais, como os suportes, muito comuns na nossa heráldica municipal, que são quase sempre os ramos de plantas, e o listel, onde vem declarado o lema do monarca, do país ou do município.

Vão-se os reis e vêm os presidentes. Os regimes republicanos buscaram ressignificar a heráldica, adicionando elementos que lhe são característicos, como, por exemplo, a troca das coroas que encimavam os escudos por barretes frígios, símbolo republicano que vem da época da Revolução Francesa.

Peça de real de a ocho conhecida como colunário; observe a representação do escudo.
1 pfennig da Saxônia

Até o século XVIII, a representação mais comum dos brasões era a reprodução simples dos elementos da composição, como nesse colunário de 1758, em que se vê o leão do Reino de Leão e o castelo que representa Castela, mas não é possível dizer qual a cor do fundo, ou o esmalte como se diz na heráldica, desses elementos. Com a mecanização da cunhagem e maior precisão nas técnicas de gravação, adotou-se um padrão de representação para os esmaltes. Como se vê neste pfennig saxão, do começo da segunda metade do século XIX, o preto, ou sable, é representado pela sobreposição de linhas verticais e horizontais num ângulo de 90 graus, e o amarelo, ou or, é representado pelo pontilhado. Sim: os esmaltes têm nomes diferentes das cores. A representação destes na numária brasileira aparece ainda no final do século XVIII.

A substituição da heráldica monárquica acompanhando os ventos republicanos também ocorreu no Brasil. Uma das primeiras providências do regime instalado em 1889 foi mudar a iconografia do meio circulante metálico que, naquele momento, resumia-se ao retrato do monarca e ao brasão imperial.

O atual brasão de armas nacional, também chamado de brasão da República, foi concebido pelo engenheiro de origem alemã João Pedro Francisco Artur Zauer, mais conhecido como Artur Zauer. Ou mais ou menos conhecido, porque as informações sobre ele são poucas, embora mais detalhes tenham aparecido nos últimos anos. Herr Zauer veio para o Brasil e trabalhou na Tipografia Universal, do Rio, propriedade dos irmãos Laemmert, também alemães. Quando da proclamação da República, ele teve a ideia de algo que poderíamos chamar de “apoteose heráldica” — na minha opinião fantasiosa e exagerada, para não dizer feia, mesmo — e mandou que Luís Gruber, também funcionário da Tipografia, fizesse o desenho, que foi apresentado ao Marechal Deodoro.

Deodoro, que, proclamada a República, tinha uma crise de diverticulite para resolver, pegou o desenho feito por Zauer e Gruber e pensou que seria uma boa ideia usá-lo como brasão nacional. O escudo sozinho, ou seja, a parte azul central, até que é interessante, mas essa estrela toda colorida, com verde, amarelo e vermelho, fora essa parte no fundo, que imita uma irradiação de luz… Um carnaval.

O brasão se tornou oficial no dia 19 de novembro de 1889, com o mesmo decreto que instituiu a bandeira republicana.

Quanto à numária, após 1889, apareceram para substituir a iconografia monárquica uma Mariana, o brasão feito por Zauer e seu… cúmplice e o escudo propriamente dito. 

O escudo sem seus adereços foi usado apenas nas peças de 20 mil-réis de ouro, batida entre 1889 e 1922, nos 1$000 e $500 de prata, de 1889, e nos 20 réis de bronze, batidos entre 1889 e 1912. Uma versão com suportes de ramos de carvalho e oliveira esteve na peça de 2 mil-réis, cujas três eras de emissão — 1891, 1896 e 1897 — formam a chamada série das três cabeças. Algo muito curioso desse escudo em específico é que a borda dele, em vez de trazer as hachuras horizontais, que representam o azul, as traz verticais, que representam o gules, ou vermelho no vocabulário da heráldica.

2$ da série “Três cabeças”

$O brasão de armas foi usado na peça de 10$ de ouro, entre 1889 e 1922; no reverso dos $500, mil e 2 mil-réis de 1912-1913, nos 2 mil-réis do Centenário da Independência; nas três peças da série MCMI, onde aparecia sobre um ramo de oliveira, e, por fim, nos 40 réis de bronze, de 1889 a 1912.

De 1922, o brasão só voltará à numária em 1956, com a série das pequeninas, de cuproalumínio e as peças de alumínio que registram era até 1961. As reproduções do brasão feitas entre 1889 e 1961 seguiam as regras de emulação dos esmaltes com padrões de hachuras e pontos. Por exemplo: os elementos verdes, ou vert, são preenchidos por linhas em 315 graus — se bem que, em várias representações, a hachura tem como base uma linha que vai do meio da base do triângulo à sua ponta, sempre tendo essa guia como 0 grau, o que acaba, digamos, “deformando” a cor. O amarelo, or, com um padrão de pontos; o escudo, azul, azure, é preenchido com hachuras horizontais. A mesma representação aparece, por exemplo, na capa desse passaporte, emitido em 2014, e é o padrão para as reproduções monocromáticas em formulários, e é tal como mostra o anexo nº 8 da lei federal nº 5.700, de 1º de setembro de 1971, que é a representação monocromática oficial.

Depois de um hiato, o brasão volta às moedas em 1985, na terceira família do segundo cruzeiro e na derivada natural, a do cruzado, até 1988. Essa representação, talvez pensada para a cunhagem em aço, não tinha os detalhes heráldicos, que são muito miúdos, e detalhes muito finos poderiam reduzir a vida útil do cunho, já que o aço é um metal menos dúctil que os usados antes. Note-se que todas as peças em que o brasão apareceu são metais mais dúcteis: prata, ouro, bronze, cuproalumínio e alumínio.

O brasão de armas dessa moeda vale-se simplesmente do relevo para destacar os elementos, deixando-nos sem saber quais são os esmaltes. E o mesmo tipo de reprodução aparece no anverso das peças de 25 centavos de real da segunda família, que trazem o retrato do Marechal Deodoro e parte do brasão, que faz fundo à figura histórica. Aliás, um detalhe muito curioso do brasão que aparece parcialmente na peça de 25 centavos é que a faixa de estrelas da parte externa do escudo tem o fundo em alto relevo e as estrelas em baixo relevo, diferente de todas as representações anteriores, que têm o fundo em baixo relevo e as estrelas em alto.

Uma peça misteriosa: 25 centavos (1994-1995)

O plano real trouxe uma estabilidade que muitos brasileiros sequer tinham chegado a conhecer. O novo meio circulante, tanto metálico como cartáceo, feito em tempo recorde pela Casa da Moeda, reintroduziu as moedas metálicas com valor real. Uma comparação algo tosca dá essa ideia: a moeda mais alta do padrão precedente, a de 100 cruzeiros reais, comprava, no dia 30 de junho de 1994, o equivalente a um quarto de pão francês; a moeda mais alta do novo padrão, a de 1 real, comprava dez pães.

A nova série de moedas chamou a atenção pela sensaboria. Feita às pressas, como eu já disse, se limitava a trazer uma efígie da República no anverso, que ainda dividia espaço com um ramo de louros estilizado combinados com linhas. Um inconveniente notório foi o fato de as taxas em centavos equivalerem às taxas em cruzeiros reais no número e nas dimensões. Ou seja, a moeda de 50 centavos usava o mesmo disco da moeda de 50 cruzeiros reais, embora a peça de 50 cruzeiros não valesse nem 2 centavos de real.

A feiura das peças colocadas em circulação no advento do plano real foi quebrada em 30 de setembro de 1994, quando o BC pôs em circulação a moeda de 25 centavos. Era novidade por vários motivos: a taxa que extrapolava o popular esquema 1-5 de números preferenciais e introduzia uma relação ainda não usada na numária brasileira: o quarto da unidade, quando o habitual era o quinto, que equivaleria à taxa de 20 centavos (como nos anos 40, 50 e 60; nos 70 e nos 80), e o desenho heptagonal na parte interna do rebordo, o que deu todo um charme especial à peça. O design chamava a atenção: as linhas onduladas no campo do reverso, dando uma ideia de movimento. E também no anverso, com a efígie da República estilizada.

Pessoalmente, eu a tenho como uma das moedas mais interessantes, esteticamente falando, sobrepujando inclusive as da segunda família, que considero terem “excesso de informação”.

Mas foi no artigo de Leonardo Rodrigues Tupinambá, As peculiaridades da moeda de 25 centavos da primeira família, que me foi dado a conhecer pelo nosso querido Edil Gomes, que algumas comparações no mínimo curiosas acabam tirando o brilho da inovação da peça de 25 centavos da primeira família.

A primeira informação importante é que, embora tenha ficado associada à primeira família, a peça de 25 centavos deveria ter sido a primeira peça de uma segunda família. Sim, existiu o projeto de uma família graficamente toda similar, como também relata Ariel Carvalho. Embora no desenho que aparece na tela a peça de 25 seja identificada como “aço latonado”, que não deixa saber exatamente se é uma liga ou se já estamos tratando das peças eletrorrevestidas, embora eu ache que seja uma liga. A informação que encontrei a respeito foi inconclusiva; como se trata de um projeto e, como eu sempre digo, a Casa da Moeda e o Banco Central são sempre muito ciosos dos seus projetos, a coisa sempre vem com aquele gosto de aproximação.

O mais interessante do artigo de Tupinambá é que ele mostra que a peça de 25 centavos é, digamos, a junção de várias ideias e designs prévios. Por exemplo, se compararmos o reverso da peça com o reverso dos 5 cruzeiros da série Magalhães, vemos que existe aí uma adaptação de estética, ou um aproveitamento de ideias, ou, pelo menos, uma inspiração.

A comparação mais interessante, porém, é com a peça de 5 colones, da Costa Rica, produzida pela Casa da Moeda do Brasil entre 1983 e 1989. O fundo hachurado do reverso lembra muito os 5 cruzeiros Magalhães, produzidos entre 1980 e 1986 e, claro, o detalhe mais importante, o heptágono na parte interna do rebordo.

A peça de 25 centavos, no seu reverso, tem os algarismos da taxa “vazados”, ou seja, com uma linha mais grossa fazendo os contornos e deixando uma área em baixo relevo na parte interna. Familiar? Pois é o mesmo recurso usado na família Tipos Regionais, feita entre 1989 e 1992. Sim, é o famoso “nada se cria, tudo se copia”. Se bem que, frisando, o conjunto é, na minha modesta opinião, muito criativo.

Temos ainda o anverso, que mostra a efígie da República; Tupinambá, no seu artigo, diz que a efígie aparenta ser, dentro do possível, um reaproveitamento daquela criada para as moedas de 1 cruzado novo e de 200 cruzados novos, comemorativas do Centenário da Proclamação da República, cujo anverso foi gravado por Aldo Cascardo e Kátia Dias. Eu estou mais para uma releitura, por conta da estilização dos traços; estilização que lembra muito o Tiradentes na moeda comemorativa do bicentenário da sua morte.

De qualquer maneira, ficam registradas impressões e parte da história dessa peça que, no seu momento, marcou a numária brasileira.

Cruzado: família provisória?

Veja o vídeo.

Ah, os anos 80. Época do Atari, das ombreiras, dos mullets, da redemocratização e dos programas de auditórios ruins. Além da hiperinflação, claro, que vinha galopando desde o final dos anos 70.

E fazendo eco a esse circo de horrores, em 28 de fevereiro de 1986 entrou em vigência o padrão monetário cruzado, como parte de um pacote de estabilização econômica capitaneado pelo então ministro da Fazenda, Dilson Funaro, que acabou sendo uma espécie de Chernobyl econômica, só lembrando o desastre atômico que aconteceu em abril daquele mesmo ano infausto.

O cruzado equivalia a mil cruzeiros de 1970.

Como sequência natural e linear do padrão precedente, o cruzado herdou o meio circulante do cruzeiro, que foi sendo adaptado. As cédulas de 10 mil, 50 mil e 100 mil cruzeiros, que haviam sido lançadas entre 84 e 85, foram remodeladas para 10, 50 e 100 cruzados, sendo as únicas cédulas aproveitadas em uma redenominação com corte de três zeros.

Mas o intuito deste texto é falar sobre o fato de que a série de moedas do cruzado era provisória.

A resolução n. 1.100 do Banco Central, a mesma que criou o cruzado, diz, no seu inciso XI, que as peças serão de: 

5 cruzados…………………………………………………..25 mm; 
1 cruzado…………………………………………………….23 mm; 
50 centavos………………………………………………….21 mm; 
20 centavos………………………………………………….19 mm; 
10 centavos………………………………………………….17 mm; 
1 centavo……………………………………………………..15 mm.

Todas têm um anverso comum, as Armas da República, e no reverso vão mudando apenas os dizeres. Coisa de uma sensaboria absoluta.

As peças metálicas do cruzeiro também foram parcialmente aproveitadas: havia os valores de 100, 200 e 500 cruzeiros, dos quais, inclusive, falamos mais detalhadamente no vídeo que aparece no card. Essas três peças foram convertidas nas peças de 10, 20 e 50 centavos, respectivamente, também sendo as únicas moedas efetivamente alteradas na passagem de um padrão a outro na história da numária brasileira.

Foram criadas, para cima, a de 1 e a de 5 cruzados e, para baixo, a de 1 centavo. Nota-se o espaço regular entre as moedas, de 2 em 2 mm; mas, no meio de 1986, quando as moedas entraram em circulação, apareceu junto uma moeda de 5 centavos, que foi defendida em voto do conselheiro do CMN Fernão Bracher e consta da ata da 465ª sessão do colegiado, em abril de 1986.

Porém, a história começa antes. Em 15 de março de 1985, José Sarney toma posse como presidente da República, em substituição ao general João Batista de Oliveira Figueiredo, o último presidente militar, e no lugar de Tancredo Neves, quem efetivamente havia sido eleito pelo Colégio Eleitoral, mas que, na data, estava oficialmente em tratamento hospitalar.

A assunção de Sarney e de uma nova equipe econômica acabou por mudar os planos para a economia e para a numária. A série planejada em 1984, com as peças de 10, 20, 50, 100 e 200 cruzeiros, jamais veria a luz e, em março de 1985, aprovou-se a cunhagem das peças já citadas de 100, 200 e 500 cruzeiros, meio que uma alteração desse projeto de 1984. Porém, acompanhando a documentação presente na ata da 447ª sessão, de 2 de maio de 85, há mais surpresas.

Na página 271 da ata, há um esquema gráfico indicando que se pensava em duas possibilidades naquele momento: o corte de três zeros, como efetivamente aconteceu, transformando mil cruzeiros em um cruzado, ou o corte de quatro zeros, que transformariam 10 mil cruzeiros em um cruzado.

Um corte de quatro zeros, embora um pouco estranho para o padrão seguido em 1942 e 1967, talvez estivesse até dentro do intuito original. A primeira cotação do dólar americano em cruzados, em 1º de março de 1986, foi de 13,77; se a redenominação tivesse sido de 10.000 para 1, teríamos uma cotação de 1,38.

Outro ponto interessante é que as cédulas e moedas de cruzados — resultado da adaptação do cone preexistente — tinha caráter provisório, como deixa transparecer o voto Diban-86/035, constante na ata da 465ª sessão do Conselho Monetário Nacional, de 4 de abril de 1986.

Esse voto, aprovado, previa quatro etapas na implantação do cruzado:

1ª etapa: 22 de abril de 1986, lançamento de cédulas carimbadas de cruzados, 10, 50 e 100.

2ª etapa: 23 de junho: lançamento das peças metálicas. O cone que conhecemos: 1, 5, 10, 20, 50 centavos e 1 e 5 cruzados.

3ª etapa: 20 de outubro, lançamento de cédulas de cruzados. Denominações: 10, 50 e 100,00 mais a cédula nova de 500 cruzados, aquela do Villa-Lobos. Cabe lembrar que essa cédula era um projeto que a Casa da Moeda tinha para a taxa de 500 mil cruzeiros. O que faz sentido, uma vez que a inflação galopante exigia o lançamento de uma cédula nova em períodos curtos de tempo.

E a etapa que nos interessa e que nunca ocorreu, a quarta etapa, que previa, para janeiro de 1988, o lançamento de uma nova família de cédulas, com características a serem fixadas posteriormente. 

Ou seja, e aqui faço destaque para as moedas, eram séries temporárias, apenas para que a CMB pudesse elaborar novos projetos, com novas temáticas. O documento traz ainda que o projeto de uma cédula nova levava até oito meses. 

E digamos que isso de um anverso comum para todas as peças, ainda mais com as armas nacionais, tem todo jeito mesmo de uma série temporária. Algo curioso é que na documentação que fala do projeto de 1984, se recomenda a adoção das armas nacionais como elemento. Vale a leitura do documento oficial, que é o voto DIBAN-84/069, do Conselheiro Affonso Celso Pastore., só dos itens 16, 17 e 18. O documento está como anexo da ata da 432ª sessão do CMN, de 1º de agosto de 1984.

16. As premissas e objetivos de racionalização delineados no mencionado plano conduziram, por outro lado, à seleção de temática que permitisse a escolha de um único elemento, que fosse comum a todos os anversos das novas moedas de Cr$ 10,00, Cr$ 20,00, Cr$ 50,00, Cr$ 100,00 e Cr$ 200,00.

17. Nesse passo, diversos motivos semânticos foram pesquisados e analisados, selecionando-se os que permitissem envolver as novas moedas de nítida e intensa significação da Nação Brasileira e, cumulativamente, projetassem todo um potencial de imediata comunicação com o público.

18. Os projetos se expressam, em consequência, mediante a representação das Armas Nacionais, Símbolo que se afeiçoa plenamente às premissas e objetivos propostos, tendo figurado inúmeras vezes em moedas e cédulas, em épocas várias, como, mais recentemente em 1956 (Cr$ 0,50, Cr$ 1,00 e Cr$ 2,00) e 1965 (Cr$ 1,00, Cr$ 2,00, Cr$ 10,00, Cr$ 20,00 e Cr$ 50,00)”.

Dessa forma o voto DIBAN-84/069 justifica o uso do brasão da República como elemento do anverso comum. O brasão da República lembra, sei lá, uma GRU, lembra burocracia. Embora seja legalmente um símbolo nacional, não parece ter esse apelo todo que o autor do voto quis trazer.

Como se chega a essa solução burocrática e inócua? Remete ao até então pior período econômico possível, ou seja, o final dos anos 50 e começo dos 60. Além das referências errôneas. As armas da República estavam, na verdade, nas pequeninas de bronze de 1956, mas de alumínio entre 1956 e 1961 e em nenhuma de 1965, que tinham trazido uma releitura do mapa do Brasil que esteve no anverso de das peças auxiliares da primeira série do cruzeiro, entre 1942 e 1956, na de 50 cruzeiros, nós tivemos a primeira versão da Tônia.

Logo, com tudo isso, se vê que a série do cruzado, de uma aridez incrível, era uma série provisória. Porém, mal sabíamos que ainda surgiria algo incrivelmente mais feio… como a primeira família do real, em 1994.

Gaúcho: a moeda que não saiu do papel

Cédula de pesos, lançada já no século XXI, mas mostrando o gaúcho, elemento comum brasileiro, argentino e também uruguaio

Em 1987, bem antes do advento do euro, Brasil e Argentina cogitaram em criar uma moeda única. Talvez a euforia do momento, pois os dois países recém saíam de regimes militares, tenham levado à ideia, que acabou não vingando.

Ambas as nações vinham com um histórico inflacionário grave, mas que ainda ia conhecer seu pico no começo dos anos 1990. O Brasil começava a ver a água no fundo da barca do cruzado, plano instaurado no começo de 1986, que tentou matar o dragão da inflação às pauladas e terminou espancado; a Argentina, com seu plano Austral, de 1985, também começava a fazer água.

O Protocolo nº 20, de 17 de julho de 1987, foi assinado pelos dois presidentes da República: José Sarney, pelo Brasil, e Raúl Afonsín, pela Argentina. Sarney visitou a Argentina nesse período e, na cidade de Viedma, capital da província patagônica de Rio Negro, assinou o documento bilateral.

Abaixo, a tradução do documento.

Protocolo nº 20: moeda

O Governo da República Argentina e o Governo da República Federativa do Brasil

Considerando:

A importância de assegurar o fortalecimento das relações financeiras e monetárias entre a República Argentina e a República Federativa do Brasil, contribuindo ao mesmo tempo para assegurar a estabilidade dos vínculos comerciais e a expansão, quantitativa e qualitativa do comércio, de forma dinâmica e equilibrada,

A influência das moedas de países terceiros cujo grau de disponibilidade foge à capacidade de decisão dos países sobre o nível do intercâmbio bilateral,

O objetivo latino-americano de criar uma unidade para lastrear os pagamentos inter-regionais,

A necessidade de iniciar um processo de criação dessa unidade monetária comum,

A conveniência de avançar no sistema vigente de financiamento recíproco estabelecido no Protocolo nº 6 para atingir o objetivo de uma integração monetária plena e duradoura;

Decidem:

1. Criar uma unidade monetária comum, denominada “gaúcho”, cujo valor seja expresso nos termos que, de comum acordo, determinem os bancos centrais dos dois países, a ser emitida e respaldada por um fundo de reserva.

2. Criar, para tal fim, um fundo de reservas Argentina-Brasil, administrado pelos respectivos bancos centrais.

3. Determinar que os resultados das compensações bilaterais realizadas em cada quadrimestre possam ser saldados com as unidades monetárias comuns até o limite de emissão acordado inicialmente em 200 milhões de unidades monetárias.

4. Determinar que os respectivos bancos centrais estabeleçam, antes de 30 de outubro de 1987, um “acordo interbancário” para a implementação da unidade monetária argentina-brasileira (“gaúcho”).

Viedma, 17 de julho de 1987.

Pelo Governo da República Argentina (assina Raúl Alfonsín)
Pelo Governo da República Federativa do Brasil (assina José Sarney)

Trata-se de iniciativa bilateral já no contexto da Declaração de Foz do Iguaçu, entre os dois países, que é considerada a base do que virá a ser o Mercosul, que se consubstanciará em 1991, com o Tratado de Assunção entre os quatro membros fundadores (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai).

A questão da integração monetária já havia sido tratada inicialmente em 1986, com o Protocolo nº 10, e, posteriormente, como se vê, no Protocolo nº 20; porém, a proposta não avançou e caiu no esquecimento (SARRIERA; CUNHA; BICHARA, 2008).

Referência

SARRIERA, J. M.; CUNHA, A. M.; BICHARA, J. da S. Moeda Única no Mercosul: uma análise da simetria a choques para o período 1995-2007. ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 36. Área 6 – Economia Internacional. Disponível em: <http://www.anpec.org.br/encontro2008/artigos/200807141128130-.pdf&gt;. Acesso em: 29 abr. 2022.

Libéria – Nova cédula de 100 dólares

O Banco Central da Libéria (CBL, na sigla em inglês) emitirá uma nova família de cédulas do dólar liberiano (LRD), começando pela de 100 LRD, a partir do mês que vem.

A nova cédula é parte da emissão de 48,7 bilhões de LRD para a nova família do meio circulante, autorizada em maio de 2021 para ser impressa em três anos: 2021, 2022 e 2024. A introdução das cédulas está de acordo com a implantação de plano desenvolvido pela Libéria em acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI).

A introdução do restante da família de cédulas – 20, 50, 500 e 1.000 LRD –, além das peças metálicas de 5 e 10 LRD, será feita paulatinamente até meados de 2022. O CBL informa que haverá um período de circulação simultânea das duas famílias, provavelmente até 2024, e que não é necessário tumulto para a troca das cédulas.

Cédulas: 100 Dollars (Libéria) (2016 & 2017 Issue) Wor:P-35b

A nova cédula é uma releitura da emissão anterior, com os mesmo motivos alegóricos e com o retrato do ex-presidente William Tolbert Jr., morto durante o golpe de Estado de 1980.

Com informações de FPA.

Moedas celebram os 30 anos do Protocolo de Proteção Ambiental do Tratado da Antártida.

A Pobjoy Mint, casa da moeda privada do Reino Unido, anunciou o lançamento de duas peças do Território Antártico Britânico, faixa de terra na Antártida reivindicada pelo Reino Unido. As moedas, com valor facial de 2 libras, comemoram o 30º Aniversário da assinatura do Protocolo de Proteção Ambiental do Tratado da Antártida. Até maio de 2013, o protocolo, cujo escopo é a proteção do ecossistema e do meio ambiente do continente, havia sido ratificado por 33 países, incluindo o Brasil.

Há duas peças: uma bimetálica, tal como as peças de igual valor facial circulantes no Reino Unido, que vem em uma cartela, e uma peça de prata, que vem em um estojo aveludado com uma cinta de cartão contendo os mesmos grafismos da cartela.

This British Antarctic Territory bi-metallic two pound celebrates twelve countries protecting one continent for 30 years through the Antarctic Treaty.
Cartela da peça bimetálica (fonte: Numismatic News)

As peças trazem, no reverso, uma foca-de-ross com seu filhote, representante da fauna local. No anverso, o retrato da Rainha Elizabeth II exclusivo da Pobjoy Mint.

The Ross Seal and its pup make an endearing image for the success of the Antarctic Treaty. 30 Years of Environmental Protect as the legend of this bi-metallic commemorative specifies.
Reverso com uma foca-de-ross e seu filhote (fonte: Numismatic News)

Cunhadas nos discos bimetálicos e em prata, as peças têm tiragem de 3.750 e 275 exemplares, respectivamente. Os preços recomendados pela fabricante são de USD 25 para a peça bimetálica e USD 75 para a de prata.

(com informações de Tom Michael)

Itália – juízes mortos pela Cosa Nostra são homenageados em moeda comemorativa

Alessandro Vinci, do Corriere della Sera

L'omaggio della Zecca dello Stato a Falcone e Borsellino: nel 2022 sulle monete da 2 euro
Anverso da peça de 2 euros (Corriere)

Uma moeda de 2 euros – a de maior valor – para recordar Giovanni Falcone e Paolo Borsellino no trigésimo aniversário de suas mortes. Conforme um decreto do Ministério da Economia e das Finanças publicado em 9 de novembro na Gazzetta Ufficiale, serão cunhadas 3 milhões de moedas: uma homenagem merecida aos dois magistrados cujas vidas foram ceifadas pelos explosivos da Cosa Nostra, em 23 de maio e 19 de julho de 1992, respectivamente, na [estrada] A29, perto de Capaci, e na rua D’Amelio, em Palermo.

Design

Longe de terem função apenas comemorativa, a nova peça será posta em circulação a partir de 2 de janeiro de 2022 e terá valor legal. Foi desenhada pelo gravador Valerio De Seta. No anverso, haverá o relevo da fotografia célebre dos dois gigantes da luta antimáfia sorridentes, um ao lado do outro, tirada por Tony Gentile justamente em 1992, antes de um simpósio sobre as relações entre política e crime organizado. Sobre suas cabeças, a inscrição “Falcone – Borsellino”, e a indicação temporal “1992-2022”.

Precedente

Não é a primeira vez que se usa a moeda de 2 euros para celebrar eventos e personalidades de destaque no panorama nacional. No ano passado, por exemplo, foi a vez dos médicos, dos enfermeiros, dos auxiliares de enfermagem, dos voluntários e de todo o pessoal empenhado na linha de frente contra a covid-19. Itens que, no futuro, farão parte das coleções e não deixarão morrer a lembrança de quem, com seu trabalho, trouxe benefícios a todo o país.